Carta da Letícia Barbosa – Uma Homeschooler nos dias de hoje!

Ao

Excelentíssimo Sr. Milton Ribeiro

Ministro da Educação do Brasil

Saudações.

Redigir esta carta representando todos os estudantes do Brasil que são educados em casa é, para mim, um grande privilégio. Sou Letícia, tenho 13 anos e estudo em casa desde 2017. Eu saí de uma sala fechada para frequentar uma sala sem muros, com inúmeras oportunidades de aprender. Saí de uma condição de distanciamento da minha família para o de proximidade e aprendizado da herança familiar. Saí também das fronteiras do meu mundo para penetrar outros diversos e distantes. Fiz amigos com os quais estudei, brinquei, dividi e somei.

O mundo, na verdade, é minha sala de aula. Logo que comecei a estudar em casa, percebi que meu ambiente de estudo não seria somente meu quarto: a sala, a cozinha, a quadra, até o parque integrariam meu espaço de conhecimento. Em cada lugar eu aprendo as mesmas coisas de um jeito diferente. No parque, aprendo com a natureza; em casa, aprendo a escrever, a ler e a ter relacionamentos reais. Esse convívio com meus pais e irmãos me fez conhecer melhor as histórias de família dos meus avós e bisavós, do caminho que me trouxe até aqui. Esse legado não se aprende em lugar algum, a não ser em casa. Este universo de lugares e pessoas é o lugar onde meu conhecimento é constituído.

Meu jeito de aprender tem também muitas formas. Nesse tempo em casa, conheci pessoas de lugares bem distantes. Aprendi inglês, música, artes e literatura com pessoas de outros lugares longe do meu estado e, confesso, aprendi muito mais assim do que aprenderia de outro modo. Na verdade, nós, da era da revolução tecnológica, não podemos limitar o jeito de ensinar e aprender. De aulas presenciais ou à distância, com familiares ou com pessoas bem distantes: assim se faz o meu conhecer.

Essas famílias invisíveis se encontraram e eu pude conhecer algumas como a minha. Eu fiz amizades com muitos meninos deste mundo, amizades que duram até hoje. Com meus amigos e irmãos, estudar passou a ser uma forma de ganhar para dividir. Nem mesmo a pandemia atrapalhou nossa amizade. Somos, talvez, famílias estranhas para alguns e silenciadas pela maioria barulhenta, mas existimos, e nos amamos.

Nós, filhos de famílias educadoras, não queremos conquistar a liberdade do ensino domiciliar a qualquer preço. Não usaremos das armas da violência, nem mesmo faremos ecoar o grito, mas nos contentaremos a continuar como somos para conquistar o que não deixaremos de ser. Vamos conduzir a nossa luta no nível avançado da dignidade e da disciplina, coisas que buscamos no dia a dia da educação em casa. Não queremos brigar com ninguém, nem com a escola, nem com o professor, nem com nosso sistema educacional. Queremos apenas um sorriso, o sorriso da liberdade, do respeito por todas as crianças e jovens que lutam todos os dias com seus pais para serem pessoas melhores, úteis à vida, à nação.

Quero ver o dia no qual as crianças brasileiras viverão o verdadeiro significado de ser criança, sabendo que todas, escolarizadas ou não, foram criadas com igualdade. Sim, eu quero a liberdade de brincar no parque sem ter medo de ser perguntada em qual escola estudo. Quero que do Norte ao Sul, do leste a oeste, em cada lugar deste nosso Brasil, possamos ter a liberdade para viver da forma como desejamos. Eu quero viver o tempo no qual o conteúdo do caráter será o critério para a qualidade da educação, e não a matrícula em uma escola.

Finalizo, parafraseando as palavras do grande Luther King: Com fé, nós poderemos esculpir na montanha do desespero uma pedra de esperança. Com essa fé, poderemos transformar as dissonantes discórdias do nosso país em uma linda sinfonia de fraternidade. Com essa fé, poderemos trabalhar juntos, orar juntos, lutar juntos, ser presos juntos, defender a liberdade juntos, sabendo que um dia haveremos de ser livres. Esse será o dia quando todos os filhos de Deus poderão cantar com um novo significado:

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas

De um povo heróico o brado retumbante

E o sol da liberdade, em raios fúlgidos

Brilhou no céu da pátria nesse instante

Se o penhor dessa igualdade

Conseguimos conquistar com braço forte

Em teu seio, ó liberdade

Desafia o nosso peito a própria morte!

Ó Pátria amada

Idolatrada

Salve! Salve!

Com nossos sinceros agradecimentos,

Letícia Rebeca Souza Barbosa