Seres Musicais
No mundo de hoje, repleto de brinquedos com alta tecnologia e metodologias complexas que prometem potencializar o desenvolvimento infantil e ao mesmo tempo entreter nossas crianças, é fácil nos esquecermos quão fundamental e eficiente é a prática musical para a formação do ser humano, começando antes mesmo do nascimento.
A música é crucial para os bebês em todos os sentidos do desenvolvimento: no que diz respeito à comunicação e à linguagem, ao bem-estar emocional e social, e até mesmo no aprimoramento de habilidades motoras. Tais benefícios para a formação da criança são observados há séculos, porém, apenas recentemente a tecnologia nos permitiu comprovar muitos desses privilégios que apenas a música é capaz de nos conceder.
Durante a última década, estudos no campo da neurociência nos mostraram que bebês recém-nascidos vêm ao mundo com todos os componentes principais da inteligência musical, como por exemplo: o reconhecimento de intervalos e consonância (ou seja, se uma peça musical é ‘afinada’ ou não), identificação onde a batida de uma música está (pulsação rítmica), julgar se um acorde está em um tom maior ou menor, diferenciação de timbres, altura e duração das notas.
Ser musical faz parte do que é ser humano, fomos criados para tal e antes mesmo de nascermos, por volta do último trimestre de gestação, a audição normalmente está funcionando a ponto de nos proporcionar até mesmo tentativas de cantarolar melodias ouvidas – isso mesmo! Há bebês que já cantarolam dentro da barriga! Quando entramos no mundo, experimentamos sons da cultura materna e somos capazes de perceber pequenas diferenças ao nosso redor como por exemplo: reconhecer vozes e músicas que ouvíamos no ventre.
Há estudos, inclusive, que nos indicam que o processamento cerebral de um recém nascido ao ouvir qualquer som (com ênfase à voz humana) é o mesmo que o de um adulto ouvindo música e, por tanto, bem diferente desse mesmo adulto ouvindo e processando palavras.
Incrível, né? Enquanto bebês, tudo o que ouvimos e percebemos auditivamente se torna “música para nossos ouvidos”!Portanto, uma criança ao nascer já responde e “entende” música, podemos dizer que é a maneira de nos comunicarmos que “já vem de fábrica”, “instalados” em nossos cérebros.
Veja bem, quando analisamos outros meios de comunicação humana como a linguagem falada e a visualização de imagens, elas estão fora da zona de compreensão de um recém-nascido. Os pais de um bebê instintivamente compreendem essa particularidade e é por isso que em todo o mundo, os adultos adaptam espontaneamente sua “fala dirigida aos bebês” em uma forma de comunicação mais aguda (geralmente uma oitava), mais melódica (cantada) e mais expressiva.
Em outras palavras, como seres humanos, utilizamos uma “fala cantada”, ou seja, enfatizamos elementos musicais enquanto falamos (usamos contornos prosódicos expressivos, glissandos entre as palavras e uma prevalência de intervalos harmônicos básicos – 3ª, 4ª, 5ª, oitava) porque são sons aos quais os bebês respondem universalmente. Muito legal, né?
Agora reflita comigo, principalmente sobre a afirmação de que “a música é uma arte humana”.
Ora, se bebês em todo o mundo, de diferentes culturas, países e épocas, respondem de forma universal a premissas composicionais que fundamentam a música ocidental, talvez não houvesse outro caminho a seguir enquanto seres humanos a não ser o de organizarmos esses estímulos e impulsos em composições e estilos musicais, culminando em obras que hoje nos são notórias.
É como se as músicas (ou pelo menos suas estruturas básicas) que conhecemos dos grandes compositores e artistas de nossa história como W. A. Mozart, J. S. Bach, L. van Beethoven, Louis Armstrong, Tom Jobim, Elvis Presley e tantos outros, já estivessem prontas e concebidas em nossa essência antes mesmo de serem “criadas” e externadas ao mundo.
A música pode ser uma arte humana, mas o Maestro de nossas vidas é também o Compositor de nossas inspirações.
