quinta-feira, maio 9, 2024
ARTIGOS

Seu texto no divã – 1ª sessão

“Ninguém escreve como um Deus, se não sofrer como um cão” – Marie von Elner-Eschenbach

Quem já esteve em uma sessão de análise com um psicanalista, entenderá muito bem o que estou falando. O divã e todo imaginário que o envolve são marcados por muitos estereótipos, que sempre trazem falsas impressões.  Certamente, estar pela primeira vez diante de um profissional que está ali para analisar você, é uma experiência que gera mais perguntas do que respostas. O mesmo ocorre quando recebo um texto para a revisão. Não é à toa que a máxima do filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein é tão usada ainda hoje: “os limites da minha linguagem são também os limites do meu pensamento”. O texto nos desnuda e revela em linhas e entrelinhas verdadeiramente quem somos.

Uma das áreas do conhecimento que mais amo é a do Direito, e não  apenas pela técnica presente nas leis, mas por ser matéria que alça  o nível mais alto da argumentação. Por atuar por muitos anos em redação forense, boa parte dos textos que reviso são da área jurídica. E por incrível que pareça vi muitos promotores, juízes e desembargadores, exímios agentes da palavra, entrarem em crise quando, por ocasião de um mestrado ou doutorado, tinham seus textos avaliados por uma banca acadêmica.

Em uma mesa-redonda da qual participei sobre leitura literária,  ouvi o consagrado escritor Zuenir Ventura compartilhar conosco sobre a angústia que sofria quando solicitava a um outro amigo escritor que lesse o seu texto e apontasse críticas. Ele nos contou que em seu último livro pediu a um amigo de sua confiança que avaliasse seu texto. Pois bem, esse “caro” amigo não só cortou duramente todo o seu esforço de escrita, mas ainda disse: tudo isso aqui é gordura! (mais da metade do livro), e arrematou: pode eliminar!

Nem preciso dizer que o livro foi um best-seller, e que, depois desse evento, o escritor optou por não mais mostrar seus projetos aos seus pares, mas deixar que o público mesmo desse o feedback de sua obra.

E você, acabou de escrever? Muito bem, agora começa o trabalho de edição e revisão, até chegar ao texto final, que você assina e pelo qual se responsabiliza publicamente.

Editar e revisar um texto é como fazer um acabamento de uma casa, depois de levantar as paredes e terminar o telhado.

O trabalho de acabamento de um texto precisa ser exigente na busca de boa comunicação com o leitor. O leitor merece sempre o melhor. É preciso dar a ele um texto bem acabado, pronto para ser lido com facilidade.

Na nossa sociedade, existe muita pressão para que se escreva “certo”. Por isso, as pessoas às vezes se esquecem de que escrever bem é que é o essencial, sem menosprezar a correção.  Quando se quer comunicação eficiente, o que é bom para o leitor vem antes do que é bom para a gramática.

Autoedição de texto

Quanto mais um redator se dedica a aperfeiçoar o próprio texto, mais aprende sobre seu processo pessoal de escrita. E também se torna cada vez mais capaz de interferir nesse processo, editando o texto com eficiência.

A autoedição é um trabalho de análise e intervenção, que se pode aprender e aplicar nos próprios trabalhos. Para isso, é preciso perceber o que há de errado e aplicar estratégias de correção. Isso é o que quer dizer colocar o texto no divã.

Distância crítica

Para aperfeiçoar um texto, é preciso olhar para ele de fora, com olhar crítico. Deixar o texto dormir é um velho e bom conselho. O trabalho de análise será mais fácil, se o texto ficar na gaveta por uns dias ou, pelo menos, de um dia para o outro.

Alguns redatores desanimam diante da tarefa de analisar seu próprio texto para aperfeiçoá-lo. Muitas pessoas desejam se livrar do que escreveram, passar adiante. Às vezes, o que atrapalha é a lembrança negativa das correções escolares, daquela esferográfica vermelho-sangue rabiscada em cada linha da prova (disso meus alunos não podem me acusar, sempre usei esferográfica verde para correção! E no corretor do Windows também!).

Diante dos obstáculos, o que diz a experiência dos bons redatores? Diz que é preciso resistir à tentação de dar o caso por encerrado. Diz que a solução está em dedicar-se a um trabalho de revisão paciente e sistemático. Com a repetição, a tarefa será cada vez mais eficiente e prazerosa.

Verifique a qualidade da informação 

Ao terminar de redigir um texto, seja um relatório ou uma proposta de trabalho, seja exigente na verificação das informações. Releia seus apontamentos, veja se tudo o que era importante está no texto. Verifique se os números e nomes estão corretos.

Reveja o roteiro: verifique se a ordem da exposição ajuda o leitor a passar de um tema a outro e a compreender bem o conjunto. Observe se a informação está suficiente, correta e bem organizada.

Importância da boa informação 

Pense na redação de um manual  com instruções para o uso de um aparelho. As explicações precisam estar muito claras, de forma que quem for usar possa seguir as instruções sem problemas.

Por mais que se escreva pensando o tempo todo no leitor e consumidor do produto, é útil testar a eficiência do manual antes da impressão. Pessoas que não conhecem o aparelho poderão ler o manual e dizer se ele está completo e fácil de entender. Cabe à redatora ouvir com atenção a avaliação dessas pessoas e modificar o texto muitas vezes, até que ele esteja compreensível para o público a que se destina.

Quando o manual é insuficiente ou confuso, o cliente se aborrece duas vezes: em primeiro lugar por não conseguir ler e, em segundo, por não poder usar o produto de maneira adequada.

A redação tem efeito sobre a vida cotidiana. Um manual com informações insuficientes ou confusas pode levar o cliente a enganos no uso do aparelho, correndo o risco de provocar defeito de funcionamento ou até de perder o produto.

Seu texto está fácil de ler?

Verifique se o texto traz as características que tornam a leitura mais agradável. Leia o texto todo atentamente numa cópia em papel ou digital. Vá sublinhando e anotando nas margens da folha o que precisa ser aperfeiçoado. Caso seja na versão digital, utilize a ferramenta “controlar alterações” e a caixa de comentários para anotações.

Para fazer esse trabalho de análise, talvez seja necessário ler o texto mais de uma vez. Não esmoreça. Seu leitor merece o melhor.

Recapitulando…vejamos então os 4 pontos mais importantes para uma boa revisão:

1. Observe títulos e subtítulos

Veja se você escreveu um título que ajuda o leitor a ativar os conhecimentos que ele tem sobre o assunto. Título e subtítulos estão ajudando o leitor a informar-se sobre o conteúdo do texto e sobre a maneira como foi organizado? Se você escreveu um texto de várias páginas, sem subtítulos, esta é a hora de colocar alguns deles para facilitar a vida do leitor.

2. Observe as palavras que usou

Você está certo de ter usado as palavras mais conhecidas e mais familiares? Substitua as palavras que talvez seu leitor não conheça, explique siglas, abreviaturas e palavras estrangeiras que não puder deixar de usar.

3. Observe a construção das frases

As frases são curtas? Verifique se estão em ordem direta, resolva intercalações e enumerações que encompridam a frase. Use e abuse dos verbos de ação.

4. Procure as pragas do texto e elimine-as

As pragas querem sobreviver, elas resistem ao extermínio. Não diminua a vigilância bem na hora de reconhecê-las e eliminá-las. Corte palavras inúteis, redundâncias, concertos de tuba e quantas pragas mais aparecerem.

Por hoje é só, pessoal! Não se esqueça do nosso lema: Escrever é arte! Revisar faz parte! Até a próxima sessão!

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